segunda-feira, 23 de março de 2015

O Custo da Tirania

Conhecemos com clareza que a escravidão custa muito ao escravo. Como resultado, temos uma abundância de discussões sobre como podemos nos libertar de nossos opressores, e sobre quem eles são. Entretanto, é notável nas discussões abundantes na internet que o termo "opressão" está sendo usado de maneira irregular e superficial. Talvez isso se deva ao fato de que nossa discussão sobre o poder está incompleta. Temos uma noção clássica de poder, a de uma influência que um ente exerce sobre o outro. Isso não é o suficiente. O que a escravidão custa ao tirano? O que o poder exerce sobre aquele que parece ser dominante em uma relação?

O que nos falta é a compreensão de que todas as partes envolvidas em uma relação de poder são igualmente influenciadas por ela. Isso porque para que possamos causar algo, precisamos ter determinadas propriedades que nos concedam um potencial de influência e, principalmente, não ter outras propriedades neutralizariam esse potencial. Por exemplo, para que eu seja capaz de coagir alguém pela força bruta, preciso ter força bruta e crueldade, e preciso não ser razoável. Para que eu mantenha meu poder, preciso manter minhas propriedades. Se eu me transformar, vou perder meu poder e sofrer a vingança dos meus escravos, que certamente me punirão tão severamente quanto eu os puniria se eles tivessem sido os primeiros a tentar romper nossa relação de poder. A tensão violenta entre um tirano e seus escravos se acumula em ambas as partes. Dessa forma, um tirano de qualquer espécie se degenera intelectualmente e emocionalmente tanto quanto seus escravos. Em ambas as partes o potencial humano não se realiza, neutralizado por uma relação de poder corrupta.

Além disso, para que alguém faça um papel em relação a mim, eu também preciso fazer um determinado papel correspondente. Por exemplo, se eu pretendo me casar com uma mulher que seja uma "dona de casa" submissa e absolutamente dependente de mim, precisarei reduzir a mim mesmo a um estereótipo para esse fim, precisarei ser o homem trabalhador autoritário e sem fraquezas. Para condenar alguém a um papel, preciso me condenar a ser a contraparte. É a falta dessa compreensão que leva algumas feministas a não compreenderem que o machismo não é necessariamente favorável na opinião um homem, ou mesmo necessariamente desfavorável na opinião de uma mulher. Ambos homens e mulheres podem ser corruptos por esse tipo de relação de poder, e ambos são igualmente capazes de desejar algo diferente.

Não acredito que seja possível o fim de todas as relações de poder, mas parece claro que podemos abandonar certas relações em particular. Todos nós, obviamente, não queremos ser escravos. Porém, muitos de nós acreditam que manipular aos outros lhes é favorável, não percebendo que pagam por esse crime com a própria humanidade. Para reter prisioneiros, é preciso tornar-se carcereiro, ou seja, é preciso viver na prisão. O primeiro passo para evitar as relações corruptas de poder é, portanto, a auto-crítica, talvez até uma autodestruição controlada. Que não haja dúvida: Os vícios de nossos semelhantes são também os nossos. Nós nos distanciamos dos monstros quando compreendemos o quanto eles nos são próximos.

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